25.11.09
a minha paragem é aqui
3.11.09
da globalização
http://www.outsiderwriters.org/
Starring Audrey Collen Burns, A. Jarrell Hayes, Sarah Ahmad, Karl Koweski, James Dye, Maria Gornell, William S. Tribell, Donald C. Mulder and Leonardo Rosado!
29.10.09
das coincidências
no entanto desta vez fico sem perceber se mais valia não se ter dado o aleatório acontecimento...
excerpto de "Magnetic Stripe Card" no site wikipedia
"The magnetic stripe
The process of attaching a magnetic stripe to a plastic card was invented by IBM under a contract with the US government for a security system. Forrest Parry, an IBM Engineer, had the idea of securing a piece of magnetic tape, the predominant storage medium at the time, to a plastic card base. He became frustrated because every adhesive he tried produced unacceptable results. The tape strip either warped or its characteristics were affected by the adhesive, rendering the tape strip unusable. After a frustrating day in the laboratory, trying to get the right adhesive, he came home with several pieces of magnetic tape and several plastic cards. As he walked in the door at home, his wife was ironing and watching TV. She immediately saw the frustration on his face and asked what was wrong. He explained the source of his frustration: inability to get the tape to "stick" to the plastic in a way that would work. She said, "Here, let me try the iron." She did and the problem was solved. The heat of the iron was just high enough to bond the tape to the card."
23.10.09
ainda sobre as palavras
13.10.09
das palavras
12.10.09
prece em prelúdio II
esse tempo passou
como água por baixo de pontes
suando a humidade nas paredes
assim vou
arfando
hoje chegado o tempo
o meu corpo todo nu varre a noite
arfando
respirando o nevoeiro
suando a maravilha
cego descalço na lama
tropeçando
na água
em vergonha arfando
por aqui já andámos
buscando os passos
o norte meu
mãos tuas
nascente de água benta
levando do meu corpo de satã
a lama
frescura ditosa trazendo nas tuas mãos a fonte
a humidade
a noite secando em calma
comigo arfando em asma
peito escancarado à sorte
a lama
prece em prelúdio I
não pertence a mais ninguém
a ira pela vida
levo tudo comigo
estrelas nos olhos
saudades em terra
falsidades
peito escancarado à sorte
triste sina
que ventura
para tanto voltar atrás
jamais esperei tamanha fortuna
as horas de baixo a cima
subindo sempre descendo
não pertence a mais ninguém a ira pela vida
poderás saber quem sou
se ao leres a palma da minha mão
a tua alma
soltar uma risada uma gargalhada
um bocejo empalidecer e morrer
nada terá a dizer ao saber quem sou
a alma
28.9.09
22.9.09
da mordedura
a realidade morde os nossos calcanhares
e quer sejamos muitos ou poucos
há sempre uma sombra
mais duradoura mais opaca que nos tolhe a expressão
atenção atenção
estamos a ficar demasiado lúcidos
e nem sequer estou a falar de sonhos lúcidos
mas da realidade palpável
da ausência do toque
da omnipresença do sem sabor
da mesclada atmosfera em perfume engarrafado
atenção atenção
esperemos que volte essa ânsia de pausar
e desfrutar o que nos rodeia com o devido respeito
8.9.09
do perigo iminente
4.9.09
da expectativa
26.8.09
nem sempre o conhecimento serve
os teus desejos insaciáveis.
17.8.09
lê-se na trompa
Como num redespertar. Um estranho acordar que se vai repetindo a cada noite; a cada dia que passa, ou se pensa que passa. Como uma experiência virtual qualquer; ou talvez não. Talvez seja apenas um normal mas assustador despertar. … “Filled With Light”.
“Filled With Light” desperta-nos em dois sentidos diferentes. Um primeiro, por ser apenas um EP que é parte de um álbum ainda a editar; e um segundo, porque nesse álbum, a poesia, elemento central e sempre presente no trabalho de Subterminal, faz a apologia da vida digital. “Filled With Light” é como que o trailer de um filme completo que veremos mais adiante; um resumo já com princípio, meio e fim. Mas para já, importante é o despertar e “Filled With Light” desperta; desperta-nos.
6.8.09
almost but not yet
5.8.09
do amor apenas
sem medo, amava, apenas.
4.8.09
nos cantos do bairro
Fugíamos à realidade pobre embelezando-a na alienação da normalidade. Fugíamos também às vezes da polícia. Personagens fantasma, pacientemente à espera que a terra cobrisse as suas campas, circundavam-nos com estórias do nunca. De órbitas perdidas fugíamos pelos sopros dos cantos do bairro, no silvo das folhas que se fechavam. Fugia eu do desencanto tentando encontrar a compensação esventrada. A brutalidade persistente entranhava-se mais e mais numa alquimia de coração para pedra. Vêem os olhos aquilo que querem no embalo do tempo. Cegueira atroz pensada incurável tão somente solúvel no domínio da pálpebra. São serenas as memórias, agora que as apago na escuridão da luz dos teus olhos.
3.8.09
Lx 4 a.m.
19.7.09
como seara
de esperança
Disse e repito para que oiças com todos os teus ouvidos podes também ler nos lábios as palavras ou nos olhos os sentidos das palavras. Jamais voltar atrás jamais inverter ser como o andorinhão-negro em frente em velocidade sempre sem parar dormimos em voo para não ter de acordar imóveis. Sabes, a fusão também é uma forma de fuga. Foges de ti. (Paulo Bernardino Ribeiro)
Duplos sentidos, choques e colisões, fuga, fuga, fuga. Discordo. Se me falares do calor que se escapa acredito em ti. Mas não me digas que fujo de mim. A não ser que queiras dizer que essa fuga é apenas mais uma forma de me encontrar. O encontro é o meu propósito e para isso serve o duplo sentido, o choque e a colisão, fuga, fuga, fuga.
Se me falares eu escuto e falo-te do calor para que em mim creias sabendo eu de antemão que essa estória do partir para me encontrar foi chão que já deu uvas que deram passas e passas agora à minha porta tu que partiste e não te encontraste. Colidimos e não me encontraste. (Paulo Bernardino Ribeiro)
Será sempre assim.
18.7.09
11.7.09
Poesia pós trauma
9.7.09
intermezzo
I
Viajo clandestinamente nos porões infectos
das palavras - fantasmas, vindas do interior do Tempo,
que arribam, nervos adentro, ao limiar do Ser,
para tentarem o assédio ao Espírito
( e às quais este se recusa a dar jazida
na doca da memória ).
II.
E, assim, na condição de errantes - eu e elas -
viajamos pelo Cosmos, com a data do óbito tatuada na face,
estimulando as nebulosas a segregarem os poemas
de que a Eternidade carece para a sua própria existência
e a Alma não dispensa para o equilíbrio instável
da sua arquitectura.
III
Caído em decúbito, o silêncio explica tudo;
e a Música sobrevive, no íntimo do cérebro,
à ruptura dos tímpanos da Alma
irreversivelmente feridos pelos timbales triunfais da Morte.
E, quando o pano cai, fico do lado de cá,
Excluído, humilhado e a mascar com raiva este abandono.
anátema
e um voo interrompido
- asas inertes cujas rémiges perderam o sentido
mas que o poeta arranca e usurpa para sentir-se alado.
Feito o poema, que dedico
ao teu corpo de mulher - substância do meu sonho -,
sou compelido a cumprir o meu destino de ave: Nidifico
no labirinto do teu sexo misterioso e aí deponho
a Via Láctea do meu sémen povoado de astros e asteróides.
Não haverá maldição, que sobre ti não caia,
se um dia renunciares a tudo o que eu te der e de mim saia,
incluindo versos e espermatozóides.
29.6.09
tecno Logos
SOU TECNOEXISTENCIALISTA
na difusa medida
em que não preciso de ser especialista
para me conhecer na plenitude de todos os sentidos
CONFESSO QUE
SOU TECNOEXISTENCIALISTA
na exacta medida
em que o algoritmo me substitui
na exactidão mecânica
deixando para mim as tarefas criativas e oníricas
27.6.09
De Anais Nin
25.6.09
da rigidez
E respiro objectivamente
Abraço o inexplicável
Que me engole para sempre
Este é o ritmo sincopado
Rígido ao invólucro
Que quebra em estilhaços
A melodia ficou para trás
Resta a inquietude
Ao espelho subtraiu-se o estanho
E na transparência a exactidão crua
Esquecido o voo
Rastejo no vácuo asséptico
19.6.09
18.6.09
dissimulámos
dissimulei voluntário a fantasia de te ter exclusiva
tanto de ti como de mim esconjurando-te por vezes
pela ausência como se de um espectro te tratasses
fiz parecer diferente para ti a realidade da fantasia
dissimulaste voluntária a realidade de me ter exclusivo
tanto de mim como de ti esconjurando-me por vezes
pela ausência como se de um espectro me tratasse
fizeste parecer diferente para mim a fantasia da realidade
conjecturámos
elevando-me quando necessário e assim declinando-te
para depois te elevar mais verdadeira e única
ainda que falsas as premissas as tuas e as minhas
conjecturaste sobre a tua posição na minha vida
elevando-te quando necessário e assim declinando-me
para depois me elevares mais verdadeiro e único
ainda que falsas as premissas as minhas e as tuas
:
17.6.09
da indiferença
A maquinaria oleada da monotonia
Espezinha furiosamente os sussurros
Ervas daninhas arrancadas
Uma a uma
Pela raiz
16.6.09
valter hugo mãe da palavra ao som
GOVERNO - Meio Bicho e Fogo from 8 e Meio on Vimeo.
5.6.09
a palavra por leonard cohen
27.5.09
como se fossemos árvore
25.5.09
24.5.09
23.5.09
da janela
.
a janela tem grades de ferro
e as tuas mãos presas a elas
de dentro a fora
e as minhas mãos presas
desde o pescoço às omoplatas
apertando as ancas
observo a rua
escuto as onomatopeias que libertas
e depois suspiro
18.5.09
da porta da rua
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
paredes meias com a sociedade
vivemos
ouvimos o cão e a família em cima
o gato e a sua dona ao lado
em baixo os amantes de tempos a tempos
contra a porta da rua
amo-te devagar
a tranca é metálica
e estremece ruidosa
ao mesmo ritmo que tu
13.5.09
do chão da sala
é de tacos de madeira
o chão da sala
e ferem os meus joelhos de osso a nu
arrefecem as tuas costas em fervura ardendo
as almofadas emudecem
o matraquear na madeira
mas não o nosso matraquear
e aquecemos a chão da sala ofegante
quando fixamos os tacos de madeira no tecto
12.5.09
11.5.09
10.5.09
na calçada do cardeal
agora que os dias crescem de luz e nevoeiro
Lisboa
e há em Lisboa uma rua uma calçada
como quem desce da graça em direcção a santa apolónia
a calçada do cardeal
e há nessa calçada uma pequena tasca
deserta a horas mortas que são as minhas horas
e tu que nunca mais chegas
e as minhas horas mortas
e o meu peito cheio de vida esperando a tua vida
não desci a santa apolónia
para te ver sair de um comboio
pois chegaste ate mim mas não foi por terra
não desci ao Tejo
para te ver sair de um navio
pois chegaste ate mim mas não foi por mar
chegaste é tudo
chegaste no primeiro dia de um mês novo
de um ano novo de uma vida nova
que seria sempre um dia novo de um mês novo
de um ano novo por me trazer vida nova
chegaste como quem sempre esteve
e reconheço a pequena tasca da calçada do cardeal
em frente a tua casa
como um espaço mágico de um tempo mágico
em que estás sem ter chegado
em que chegas sem te ausentares
há uma doença benigna na minha memória sempre que estás
(e estás mesmo antes de chegar)
e cada minuto de abraçar o teu ar
cada minuto de respirar o teu braço
e cada minuto de pressentir o teu corpo
cada minuto de possuir o teu espírito
esqueço dias de meses anteriores
de anos anteriores de vidas anteriores
das minhas e das tuas
horas vidas recantos lugares memórias
esqueço a vida os tempos e os espaços
cada minuto da tua presença
faz-me esquecer um dia da tua ausência
em breve não saberei quem sou
só tu existes
nessa calçada
nessa cidade
neste homem
'atocha' pintura de António Lopez-Garcia
esta é uma outra cidade.
mas as cidades são todas iguais.
4.5.09
das realidades de papel
Depois do sucesso que foi a Primeira Colectânea de Poesia Contemporânea do Portal Lisboa e da Chiado Editora (www.chiadoeditora.com), com o nome “Entre o Sono e o Sonho”, o Portal de Lisboa está agora a arrancar com o II Volume da mesma colectânea. Neste momento, procuram novos autores para entrarem neste livro. Quem quiser pode visitar o regulamento (Link Regulamento) desta colectânea no site do Portal de Lisboa. As inscrições podem ser feitas aqui (Link Inscrição).
Os autores que quiserem participar podem submeter até vinte dos seus melhores poemas, sem tema obrigatório. É absolutamente necessário que possuam qualidade, pelo que o Portal de Lisboa reserva-se o direito de não seleccionar algum autor que no seu entender não tenha essa qualidade. Esta obra será editada pela Chiado Editora, uma editora de referência que oferece garantias de um trabalho feito com profissionalismo. O prazo para inscrição termina a 1 de Julho de 2009.
1.5.09
poema introdutório
e o pacto nervos-alma é denunciado nesse instante..
Todas as coisas, especialmente as flores, têm o ar de quem chega
e ninguém as espera.
Por isso, há óvulos dependurados em todas as árvores
desesperando que os frustrem ou fecundem,
enquanto as mãos dos poetas se entregam como fêmeas
ao insaciável desejo de alma dos objectos inertes.
- Mas, afinal, sentir as coisas é adiar a sua posse,
não é, senhor Diabo, encantador de serpentes?
Adeus, roçar lascivo do devir,
que exacerbas até ao transe
a fome secular com que roemos as coisas!
Adeus, aves felizes, que saturastes de voos inúteis todo o espaço possível!
Adeus, adeus, barcos sexuados e expectantes,
que tendes as proas varadas na memória das viagens
através da solidão que separa as estrelas entre si!
( Oh, este nosso morrer de morte a bordo! )
- Deixai-me simplesmente que dissipe esta lírica e herdada
sensação de baía do ponto de vista do mar.
O que se ama, isso ( di-lo a música ) é o nosso próprio limite.
26.4.09
das rugas o cimento
do imaginário
'boneca e gato com cadeira vazia, paúl de santo antão cabo verde'
há alguem desse lado que queira contar esta estória?
25.4.09
da digital idade
Somos arquitectos puros
Não temos de nos preocupar em explicar o que une a recta mais que o conjunto dos seus pontos
Somos visionários
Não temos medo da alma nem do segredo nem do desconhecido
Somos fantasmas dentro da máquina
Nós somos verdadeiramente o fantasma
Os sussurros são nossos fragmentos interjeições perguntas e respostas
A causa e a consequência da memória
24.4.09
movimento perpétuo
De que tudo no mundo é relativo,
Quando é certo que em tudo o que medimos
é a nossa própria dimensão que achamos.
Em cada óbito o cosmos morre inteiro
E inteiro vai ressuscitar no óvulo
Que, fecundado, vinga.
22.4.09
da inexistência física
21.4.09
correr bastante sorrir
viver bastante até ser gato
sonhar imóvel num muro de cal
correr sob os telhados das casas das vizinhas
resgatar bastante as estrelas à noite
partir em mais que uma direcção
sorrir desalmadamente e não deixar rastro
entrar bastante em glóbulos brancos de sangue novo
dormir o sono dos justos
correr nu sobre os últimos poemas de amor de um poeta
desejar bastante a vida num minuto
sorrir antecipando-me assim à morte
soltar o corpo dentro do corpo das vizinhas dos telhados
17.4.09
completamente pa bó
Na caixa aberta divagamos. Gritamos alto, enganando o silvo-trova que passa. Rimos das tontas curvas que faz a pick-up. Que farão os passageiros no interior? Espreitamos pelo vidro e rimo-nos do absurdo da traquinagem.
15.4.09
di nove di mei dia
Na caixa aberta tentamos proteger os cabelos. O vento alucina na passagem pelas nossas bochechas. O pano aberto ensaia-se a vela. Poderia ter-te visto a voar, a voar, perdida no oceano imenso que nos rodeia. Rimo-nos ao invés a bandeiras despregadas.
14.4.09
nós que vivemos digitalmente vos agradecemos
Chegámos aqui Jack Kilby e Robert Noyce
Sem vocês não seríamos nada
Sem vocês continuaríamos a seguir cegos por esse mundo fora
Sem vocês ainda rastejaríamos numa terra sem horizonte
Convosco somos plenos
Convosco a roda dentada óleo lubrificante motor de combustão é o legado arqueológico
Agora impelimos o rastilho através da analogia
Movemo-nos discretamente em frente
tud dreto
12.4.09
return
Se não contribuir sou expulsa. Não me posso dar a esse luxo. Contribuo. Com palavras vazias de sentido, palavras cheias de conteúdo. Fotos imagens perdidas encontradas no versículo galáctico. Enveredo por uma viagem absurda sem retorno. Todos vós já o fizestes, imagino. Faço-o eu também agora. Pedirei conselhos. Se assim se prover, loucura o permitindo. Carrego no ventre os filhos dos deuses.
9.4.09
céu anil sobre terra ocre
a pele que cobre as papoilas
viçosas de vento
agora a duas cores
o ocre do teu cálice
o anil do teu cabelo
e falo contigo a duas vozes
a pele com que respiro
pedaços de presença
deserto de restolho outrora vida
dentro da carne
nas retinas do meu peito
céu anil sobre terra ocre
ao fim da tarde
o deserto é luminoso
como é estupendo
entrar na terra respirar o ar
alimentar-me a duas cores
excerto de livro inédito
Da minha loucura serei dono
só porque tem sido pacífica e prolongada a posse ?
E o Outono,
disfarçado de ave migradora, por mais que no seu voo roce
a infinitude do tempo, poderá vir a ser dono
das folhas que mata de amarelo ?
São porventura meus os arquétipos que aceito, uso e esfacelo
na minha mente e que tento depois com as mãos da memória
/ reconstruir no barro
substancial das palavras - e não posso ?
Só o sarro
de tudo quanto existe é verdadeiramente nosso
( e mesmo assim invocando a usucapião ).
E até esse ( ou isso ) irá comigo um dia dar sentido ao chão.
8.4.09
vitral em parede cega
Por isso, o dia nasce já com asas emprestadas
e o corpo hipotecado à luz que o devora;
por isso, é que as imagens das coisas jacentes na memória
são apenas pressentidas e como tal guardadas
- enfim, simples escória
para deitar ao lixo.
7.4.09
poema introdutório
não lhes faz falta
porque elas continuam a ser do mesmo modo.
Mas há um cavalo de ventas mornas
com patas como qualquer cavalo e asas como nenhum...
( As rédeas são notas agudas de flauta
e o flanco fácil e sereno).
O seu nascer é ininterrupto
para morrer amanhã.
- E tal não acontece ao mesmo tempo por um truque de câmbio,
para que a morte não perca o seu valor extrínseco
nas obsessões da água
e na alegria dos bichos,
enquanto permanece inefável a conjugação de sexos nas árvores.
Mas não bastam as asas ao cavalo:
São necessárias as patas,
imprescindíveis as patas do cavalo
- funcionais, autênticas, terríveis -
porque as patas do Pégaso são falsas
à força de tanto desdobrarem asas subservientes.
Asas? Quase inúteis...
Se as patas forem patas
capazes de bradar no solo surdo,
o céu há-de baixar-se para que o cavalo o penetre.
6.4.09
do regresso da não ausência
1.4.09
da natureza dos lugares
25.3.09
da volatilidade
Assisto enclausurado à transformação da carne, ao percurso volátil dos músculos liquefeitos nos membros retorcidos. A pele transmuta-se em pedra fustigada pelo vento e pelo mar. Os polos de repulsão eléctrica pulsam aleatoriamente pelo rosto.
Só eu pareço aperceber-me, a plateia finge-se demasiado ocupada a preparar a sua defesa, contra o ataque das condições desumanas, contra o assalto da realidade visível e invisível.
Ainda agora me percorre um calafrio, um choque eléctrico, sempre que acordado cerro as pálpebras. Sempre que adormecido sucumbo aos sonhos em que sinto o toque suave dos teus dedos.
quatro registos de um verão mental
A LIBÉLULA
No charco da memória,
aí, onde se dá a metamorfose das palavras
e o sedimento dos dias se acumula,
aí - e só aí - a solidão é fértil
e o grito atinge as nebulosas.
O torpor da libélula,
que desova num junco,
torna menos efémero o fluir do tempo
e bem mais íntima e secreta a presença da água
na construção da metáfora
e nos olhos do poema.
2
A CARPA
A astuta carpa lentamente nada,
desenhando na vasa a geratriz do silêncio.
Ela antecipa-se às estrelas e prepara a Noite
para o sonoro e prolongado êxtase
da cópula das rãs.
Ejaculada no espaço sideral,
a Via-Láctea inunda de prazer
as mucosas genitais da intemporalidade,
enquanto a carpa astuta lentamente nada.
3
O SALGUEIRO - CHORÃO
Fototropismo, sim, mas quanto baste !
E tal como Jacob contra o Anjo
o salgueiro - chorão resiste ao sol do meio-dia
para que a água o deixe acariciar-lhe a cútis
e as aves vão beber na ponta dos seus dedos.
4
O FENO
É no odor do feno,
quando o sol arde, louco de ciúme,
que o nosso amor se assume
autêntico e pleno.
E, deste Estio quente,
só isso e o feno ficam no cérebro da gente.
arca encoirada
e engoliu a chave:
Sou agora a ave
que cai com a calma,
( como no soneto
de Sá de Miranda ).
Lá poetar, poeto;
mas quem pode e manda
deixa, porventura,
que eu próprio me abra,
usando a loucura
como pé de cabra ?
Se Deus não defeca,
nem bolça o que ingere,
nada há que eu espere
desta inútil seca.
Ele há-de, porém,
descobrir no fim
que a chave que tem
não me abre a mim.
22.3.09
transfiguração errada
Há uma fraude na paisagem: A luz que a ilumina é da véspera!
E o estafeta, dando por isso, pára de repente
e, ante o pasmo de córregos e árvores,
deixa cair da mão o testemunho inútil
e morre afogado em desespero.
...........................................................
...........................................................
É então que surge um anjo resplandecente de luz
( daquela mesma luz que antes faltava à paisagem ),
e arrebata consigo o testemunho,
ainda quente,
não do chão mas da mão, agora fria,
do poeta que fica, inteiro mas bem morto,
a apodrecer nas cores do Arco da Aliança.
16.3.09
das alterações climáticas
11.3.09
do murmúrio
Os dedos amarelados traem a imensidão rochosa desse peito. Esse peito aberto ao vento que inspira e transpira desconforto. Nos lábios gotejantes, diamantes disfarçam-se em nuvens de fumo e o beijo é substituído pela sofreguidão de um sorriso forçado.
Duvidas do amor por breves instantes e questionas a alienação por longos momentos.
Esse murmúrio rochoso que se instalou no homem de quem falo não se deve à solidão do amor, mas sim ao fumo do esquecimento. Deseja o esquecimento e evita a todo custo o amor toxicodepência.
Por isso os lábios onde se formavam diamantes de ternura transformaram-se em duas pedras angulares inorgânicas. Sofregamente inalam e trituram monóxido.
6.3.09
encenação para a morte dum poeta
ENCENAÇÃO PARA A MORTE DUM POETA
Alguém desceu pela lingueta de pedra até ao rio,
transportando uma angústia feita corda
com uma das pontas amarrada ao paredão
e a outra à volta do pescoço.
Deitou-se depois no fundo dum caíque, abriu as pernas
e, encalhando os tornozelos nas forquilhas dos remos,
aí ficou com os pés agrilhoados.
Seguidamente pôs-se a roer, até ao ponto de ruptura,
a outra corda ( a que prendia o barco à margem ).
E, muito antes de a noite se esvaziar de todo
pelo esgoto aberto das pupilas dilatadas,
o rio, em maré viva e na vazante, fez o resto.
4.3.09
tragédia ao sol posto
Enquanto o Sol, ébrio de desejo, se desenvencilha da Luz,
hipotecando ao Tempo a sua própria parte de Infinito,
a Noite despe a túnica e fica em vão à espera
da prometida metamorfose eternamente adiada.
A única referência para o debuxo do poema é o coaxar das rãs
no charco onde, por reflexão, se precipitam os astros
e, por sadismo, se afogam os poetas.
As aves não dormem, simplesmente esperam,
tal como a Noite,
que o mesmo Sol as transforme em voos de pura claridade
e em gorjeios matinais eficazmente obscenos.
E porque as palavras não cabem no silêncio estelar,
renuncio à minha própria parte de Infinito
e concedo-lhes espaço nos meus versos.
da consciência
A paixão desdobra-se abrupta
Em tristeza e agonia
Quando a mão aprisiona a luz
E a euforia da conquista
Não mais se encontra no coração
Que sofre
2.3.09
cicatrizes
Lembrar-te é o despedir-me de pássaros no outono,
debruçado na ponte de ferro
que liga o teu abandono
ao meu berro.
27.2.09
cidade nua
Neste domingo sem Sol, em que vieste e choveu
inesperadamente sobre os pássaros e no violino do cego,
o jardim público, onde as crianças, há pouco, eram o mais importante,
surgiu-me decadente como um império nascido
da ambição de uns tantos,
do heroísmo ocasional de alguns
e da escravidão dos outros.
As cascas dos tremoços, cuspidas por bocas insuspeitas
e por outras prostituídas,
aumentavam o lixo metafísico das minhas recordações inventadas.
Sim, porque inventar recordações
é um honesto entretenimento dos deuses
e um trágico destino dos poetas
e de todos os que sonham aos domingos, quando há Sol,
e depois chegas tu, realidade absurda e tolerada,
e choves, sem nos molhares,
deixando-nos encharcados de pegajosa melancolia -
- esse humilhante lacre com que o tempo torna invioláveis
os segredos das coisas.
O lago, a estátua, a simetria estúpida dos canteiros;
as ruas de saibro cilindrado e de traçado tão diferente
das rotas dos astros;
essa gruta com falsas estalactites de cimento,
mais o polícia com que a moral adorna os parques públicos -
- tudo o que jaz no jardim e saiu de cabeças humanas,
deixando-as aliviadas e porventura felizes
( as cabeças respeitáveis dos senhores vereadores,
do senhor arquitecto paisagista,
do senhor escultor de bustos encomendados e, por isso, difíceis ) -
- tudo isso pretende agora instalar-se de qualquer jeito
na minha memória
( sem ter lugar marcado,
como num transporte colectivo já repleto ),
ante a minha obstinada, peremptória e vã recusa.
É meu desejo, porém, levar comigo,
para o depois de amanhã da véspera da minha morte apenas as coisas do parque que não sairam de cabeça nenhuma
( e caibam na minha ),
ordenadas embora como quesitos de um agravo sem alçada possível:
1º - As flores hermafroditas, e só essas,
porque as outras sabem bem o que é amar.
2º - Os peixes degredados no lago artificial,
essa estranha e inútil infra-estrutura das paisagens urbanas
incipientemente retocadas por mãos que se goraram no espanto.
3º - As árvores defraudadas na liberdade do seu fototropismo
por podas perversas.
4º - O cego, mas sem o violino,
uma vez que as cordas deste não podem substituir-lhe os nervos ópticos.
5º - Os namorados, tão inocentes afinal nas suas malícias telecomandadas.
6º - As crianças, que mais tarde darão conta de que alguém as abandonou,
à porta do Universo,
com um jogo de cueiros, sem quaisquer iniciais bordadas,
e sem chapa de identificação ao pescoço (falta esta que bem pode vir a ser suprida com a corda que hoje saltam ).
7º - A velha e miserável vendedora de tremoços,
que nunca ouviu falar de metafísica
( e não precisa disso para nada
porque ela própria a encarna,
quando o seu lutar pela vida não se parece com o dos bichos
e apenas resulta do seu consciente medo de morrer ).
Quem de direito dirá, depois, se é preciso autenticar estes quesitos
e reconhecerem-me a assinatura.
De qualquer modo, informo, desde já,
que tenho sinais abertos em vários cartórios oficiais:
Para lá da sarça, onde Deus se escondeu para falar a Moisés;
no magma, onde o Diabo sustenta o seu harém;
nas areias das praias solitárias
onde somente a erosão é a lasciva e venal testemunha do Tempo,
e na terceira circunvolução esquerda do meu cérebro.
24.2.09
alumina
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